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terça-feira, 27 de julho de 2010

O Duplo


Sugerido ou estimulado pelos espelhos, as águas e os irmãos gémeos, o conceito do Duplo é comum a muitas nações. É verosímil supor que sentenças como "Um amigo é um outro eu" de Pitágoras ou o "Conhece-te a ti mesmo" platónico se inspiraram nele. Na Alemanha chamaram-lhe o Doppelganger, na Escócia o Fetch, porque vem buscar (fetch) os homens para os levar à morte. Encontrar-se consigo mesmo é, portanto, ignominioso; a trágica balada Ticonderoga de Robert Louis Stevenson refere uma lenda sobre este tema. Recordemos também o estranho quadro How they met themselves de Rossetti.

Para os judeus, em contrapartida, o aparecimento do Duplo não era presságio de uma morte próxima. Era a certeza de ter alcançado o estado profético. Assim o explica Gershom Scholem. Uma tradição recolhida pelo Talmude narra o caso de um homem à procura de Deus, que se encontrou consigo mesmo.

No relato William Wilson de Poe, o Duplo é a consciência do herói. Este mata-o e morre. Na poesia de Yeats, o Duplo é o nosso anverso, o nosso contrário, o que nos complementa, o que não somos nem seremos.

Plutarco escreve que os Gregos deram o nome de "outro eu" ao representante de um rei. 


in O Livro dos Seres Imaginários, de Jorge Luis Borges
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